quinta-feira, 8 de junho de 2017

História do nome de Deus

placa de pedra de Ur, do séc. 10 a.C., ilustrando o deus Baal

Em 1999, uma profunda discussão sobre a história hebraica surgiu quando o arqueólogo Ze’ev Herzog anunciou no jornal Ha'aretz Magazine em Tel Aviv os resultados de suas escavações. Buscando em Canaã pelos vestígios da antiguidade de seu povo, ele e seus colegas acabaram encontrando sérias divergências entre as evidências históricas e o Velho Testamento (VT). Dos tempos de Josué, Herzog não encontrou muitas das muralhas citadas no Antigo Testamento - nem sequer a fundação delas. Várias das cidades históricas tinham desaparecido e ressurgido ao longo dos últimos 1000 anos da Idade do Bronze, sem vestígios de grandes batalhas. Dos tempos de Davi e Salomão (séc. 10 a.C.), mesmo Israel não possuiu muralhas verdadeiras, que fossem capazes de resistir a um ataque. Mais bombástico ainda, Herzog só encontrou evidências de monoteísmo a partir do séc. 7 a.C., no reinado de Josias e época da destruição de Samaria pelos Assírios. Antes disso, YHWH, Baal, Asherat e até Moloch pareciam divindades quase igualmente cultuadas em Canaã. Algumas inscrições inclusive confundiam os deuses masculinos, colocando um e outro como maridos de Asherat, que parecia ser uma deusa mãe aparentada com In-nanna (Sumérios), Ishtar (Caldeus), Afrodite (Gregos) e Hathor (Egípcios).

O rei Josias se esforçou para reformar a religião hebraica, extirpando os altares e templos de outros deuses (2ª Crônicas 34.3). Segundo Herzog, o que ele fez na verdade foi unificar todos os cultos; apesar de a transformação parecer radical, talvez não fizesse muito mais do que eleger o próprio Josias como vice-rei ou governador de Deus aqui na Terra. Nessa posição, ele promoveu transformações significativas. E pelo motivo dessa unificação, provavelmente, o nome de Deus foi proibido de ser pronunciado por algumas dezenas de anos – eram vários nomes.

Na Bíblia atual, quase 2700 anos depois do rei Josias, Deus ainda aparece designado por diversos nomes. Mesmo se Herzog estiver errado, porque afinal Deus Se designou ou foi designado por tantos nomes diferentes? Seguindo a lógica de Jesus, que mudava nomes próprios como símbolo de um novo caminho da pessoa, será que Deus se modificou também enquanto o VT era registrado?

Os historiadores que se debruçaram sobre os textos bíblicos, desde a Antiguidade, em geral concordam com Herzog no sentido de que os vários nomes de Deus são sinais de re-edições dos cultos, como se uma divindade fosse lapidada para se conformar a outros tempos. Algo semelhante aconteceu com os deuses do Candomblé no Brasil e Caribe, fundidos aos santos Católicos. Na Idade Média, foram muitos os santos Católicos que nasceram de deuses pagãos da Europa. Na Cabala judaica, o panteão de anjos (não citados no Velho Testamento) também guarda fortes traços do politeísmo Europeu. No VT, chama a atenção o fato de que o nome final/oficial de Deus – Javé – é praticamente ausente dos nomes de lugares em Canaã. Se nomes teofóricos fazem referências a divindades, em Canaã a maioria deles contém El (ex. Yisra-El = El luta) ou Baal (ex. Baalbek = Senhor das fontes), justamente divindades demonificadas ao longo do VT. Como é possível que os conquistadores de Josué ou os reformadores de Josias tenham morado nesses locais? Para tentar responder algumas dessas perguntas, proponho regredirmos no tempo em busca dos antigos nomes de Deus.

PRONÚNCIA ATUAL

Num 1º passo, vamos até a Reforma Protestante (1507), quando Lutero traduziu para o alemão os textos gregos do VT e do NT. Ele usou como referência os textos sagrados dos Masoretas (do hebraico Mesorah = tradição), estudiosos da língua hebraica que iniciaram seus trabalhos no séc. 7 d.C. como copistas da Torah. YHWH (o nome usado no VT) é escrito com apenas consoantes e não tem pronúncia definida, por isso Lutero decidiu pela tradução Yeová/Jeová. Essa pronúncia se perpetuou em muitas traduções da Bíblia desde então. Se recuarmos um pouco mais nessa época de impérios, quando o Cristianismo era levado como bandeira em grandes invasões ou Cruzadas, por volta do séc. 10 os Católicos usavam uma tradução romana do VT onde Deus aparecia com os nomes Ieve, Iao, Ia até Iabe. A semelhança com Javé/Iavé, usadas no final da Idade Média, é clara. Algumas traduções em latim feitas a partir do hebraico traziam ainda Dominus (Senhor) ou o equivalente Adonai.

A ERA DAS SUBSTITUIÇÕES

Adonai e Dominus já são o que se chama de substituições, que consistem em alguém não escrever o nome de Deus, por considerá-lo sagrado demais. Essa prática nos leva para os séculos 2-4 d.C. Era o tempo da perseguição romana aos Cristãos, mas também um período crítico para os Judeus. O Novo Templo (erguido por ordem de Ciro da Pérsia a partir de 530 a.C. e reformado por Herodes, o grande, de Roma, em 20 a.C.) e a própria Jerusalém haviam sido destruídos por Roma. Os Judeus e os Cristãos estavam espalhados pelo Império, afastados de cargos políticos e organizando grupos de culto independentes. Sem seus lugares sagrados, os Fariseus e Saduceus dos tempos de Jesus foram substituídos por rabinos, estudiosos que deviam interpretar as Escrituras e orientar os homens quanto a sua aplicação. Pronunciar o nome de Deus (YHWH) foi considerado um pecado muito grave, de forma que tal nome era substituído na leitura e até na cópia dos textos por Ha Shem/Shema (O nome), Ha Magom (o Onipresente), Ha Mana (o Piedoso) ou Adonai (o Senhor). Alguns copistas simplesmente deixavam uma lacuna onde estaria o nome de Deus, por temor de escrevê-lo. Um dos mais citados rabinos, Maimonides (1135-1204), contudo, ensinava que YHWH era pronunciado abertamente na liturgia dentro do Novo Templo.

Quando Alexandre o grande invadiu o Oriente Médio (300 a.C.), um de seus generais-sucessores - Ptolomeu II - ordenou a tradução dos livros hebraicos do Pentateuco para o grego, tarefa que foi dada a 72 estudiosos. Eles produziram uma versão do VT conhecida como Septuaginta, que deu origem à versão romana dos livros, que foi utilizada pelas primeiras comunidades Cristãs na Síria, Grécia e Roma, nos séculos 2-4 d.C. Tais comunidades absorveram dos Judeus valores e tabus como a proibição quanto a escrever ou pronunciar o nome de Deus, de forma que nos livros Cristãos, assim como nos Judaicos, YHWH passou a ser substituído por Kyrios (Senhor) ou Theos (Deus). Alguns manuscritos mantiveram as letras hebraicas de YHWH.

A REFORMA DE JOSIAS

Josias foi um rei de Judá cuja referência só aparece nos textos bíblicos. Segundo as Escrituras, ele empreendeu por volta de 620 a.C. as reformas no Templo iniciadas pelo rei Joás cerca de 200 anos antes. Junto ao profeta Hilkias e profetisa Hulda, Josias recuperou textos sagrados guardados no Templo, que se referiam à história de Israel desde Moisés e os mandamentos de Deus, aparentemente esquecidos desde o reinado de Salomão. Josias ordenou a execução dos profetas de Baal, a destruição dos templos de Asherah (representada por vacas de ouro, 1ª Reis 12.28-30) em Bethel e Dan, assim como a exumação dos profetas de Baal e Asherah enterrados nos montes aos redor de Jerusalém.

As ações enérgicas de Josias mostram o quanto o culto de outros deuses (além de YHWH) era comum em Canaã, relembrando quando Moisés destruiu o bezerro de ouro forjado junto a Aarão durante sua estadia no Sinai. Por outro lado, a presença dessas divindades faz pensar que se passou muito tempo desde uma monarquia monoteísta como é relatado para Davi e Salomão. Na verdade, mal haviam se passado 200 anos, com o Templo em plena atividade. As mudanças aparentemente sérias feitas por Josias e as descobertas de Herzog sugerem que Josias fez mais do que uma reforma religiosa: ele contratou escribas para unir estórias e tecer o passado de Judá, mesmo que fossem bastante imaginativos quanto a isso, assim como Heródoto - o 1º historiador - foi em relação aos povos que visitou. A semelhança textual entre passagens do livro de Josué e os textos sobre Josias levaram vários historiadores a desconfiar seriamente que os autores de um e outro eram os mesmos escribas.

Josias morreu tentando impedir que os exércitos Egípcios cruzassem Canaã para chegar até a Assíria.

A CONSOLIDAÇÃO DOS REINOS DE CANAÃ

No séc. 9 a.C, logo após Salomão, quando as 12 tribos foram divididas entre os príncipes Judeus, Judá (reino do Sul) e Israel (reino do Norte) aproveitaram o vácuo de poder entre as retrações do Egito e da Assíria para estender as fronteira de seus reinos sobre os demais povos de Canaã. Isso significava estender também o deus de Judá e Israel (YHWH) sobre os deuses de outros povos, como Qemosh, de Moab. O rei Mesa/Mesha de Moab mandou inscrever uma estela de pedra com seus feitos militares e as batalhas que travou com Israel, referindo claramente YHWH como a divindade de seus adversários.

O VT refere a esse período como contaminante sobre os cultos de Judá e Israel, pois os empreendimentos militares também misturavam as populações dos Judeus com os demais habitantes de Canaã, levando para os Judeus deuses estranhos e abomináveis. Baal, por exemplo, era um deus da tempestade e da agricultura, costumeiramente adorado ao redor de postes (ou para-raios?) no alto dos montes. Outra figura introduzida foi Asherat/Asserá, uma deusa-mãe associada com os bosques, florestas e árvores sagradas. Enquanto alguns reis Judeus perseguiram tais cultos, outros como Akab/Ahab foram coniventes e até envolvidos com eles, a ponto de fixarem imagens e gravuras deles no Templo. YHWH, referido como a principal divindade dos Judeus e citado pelo menos 6800 vezes na Bíblia, era nomeado por uma palavra de pronúncia duvidosa ou inexistente, que significa supostamente “Eu sou” e não define nada sobre Deus em termos humanos.

Mesmo na época de Davi e Salomão (séc. 10 a.C.), algumas curiosas referências a Deus aparecem:

[YHWH] subiu sobre um querubim e voou; e foi visto sobre as asas do vento. E por tendas pôs as trevas ao redor de Si, das águas e nuvens dos céus. Pelo resplendor da Sua presença brasas de fogo se acenderam. Trovejou desde os céus [YHWH]; e [Elyon] fez soar a sua voz. Disparou flechas e raios. (2ª Samuel 22.11-15)

[Elohim] está na congregação de [El]; Ele julga no meio dos [Elohim]. ... Eu disse: Vós sois [Elohim], e todos vós filhos do [Elyon]. Todavia morrereis como homens, e caireis como qualquer um dos príncipes. (Salmo 82)

Elohim era uma palavra usada para designar Deus, terminada em –im como poucas outras palavras do hebraico no singular (ex. Efraim). Na Bíblia, Elohim é a 2ª forma mais comum do nome de Deus, aparecendo mais de 2500 vezes. Tal palavra não deixou de atrair a atenção de muitos estudiosos pois, oficialmente falando, Elohim significa “deuses”. Mais ainda, havia um deus da terra de Ur (de onde veio Abraão) chamado El/Elyon, senhor dos raios, que se reunia com os deuses menores (Elohim) e os enviava para a Terra, para habitar em meio aos homens. Para completar, muitos lugares sagrados em Canaã levam a terminação –El, como se pertencessem a um deus com esse nome. Esse deus era chamado de senhor dos leões; e a figura do “leão de Judá” não poderia trazer uma história mais curiosa. Para completar, El era casado com Asherat, a divindade perseguida pelo rei Josias. Segundo a mitologia dos Sumérios de Ur, os deuses El e Asherat tiveram 70 filhos, enviados para reinar entre os homens DE ACORDO COM OS NÚMEROS DE CADA NAÇÃO. Alguns nomes que aparecem entre tais filhos, em especial recebendo as terras de Canaã, são Baal e Yaweh!

Quando [Elyon] deu às nações a sua herança, quando dividiu toda a humanidade, estabeleceu fronteiras para os povos de acordo com o número dos filhos de Israel. (Deuteronômio 32.8)

As especulações sobre Abraão ter trazido de Ur as divindades locais não podiam faltar. No meio do caminho, entre Ur e Canaã, mais próximo dessa última, na terra que já foi chamada de Madiã e hoje sedia a Arábia Saudita, Elohim ainda derivou as palavras Elaha (idioma Arameu, séc. 5 a.C.), Alaha (idioma Sírio, séc. 2 d.C.) e depois Allah (idioma Persa/Árabe, séc. 5 d.C.). Se o parentesco dos nomes é o que parece ser, El/Elyon é também Allah, de alguma forma pai/ancestral de Baal e Yaweh, que são deuses irmãos, ambos “senhores dos exércitos”.

ENTRE OS FILHOS DE RÁ

Em termos de Quem era o deus dos Israelitas no início de Canaã, podemos pensar em duas épocas: antes e depois do estabelecimento da monarquia. Antes dos juízes e reis iniciando com Saul, havia cidades-estado com deuses locais, derivados principalmente da cultura de Ur (Suméria). Com a chegada dos Hyksos, valores do Egito foram misturados aos deuses de Canaã, favorecendo divindades regionais e até nacionais. Em nossa proposta de ir rumo aos tempos mais remotos, vamos primeiramente falar da influência Egípcia em Canaã, ou seja, da época do início da monarquia.

A primeira referência Egípcia em Canaã evidentemente é o controverso Moisés. Como já discutido em outro texto, o Moisés bíblico parece ser uma fusão de vários personagens, o que de fato seria esperado se as estórias sobre ele tivessem sido reunidas ou costuradas nos tempos de Josias (648-609 a.C.) e não na época dele mesmo.

O Moisés mais antigo (aprox. 1500 a.C.), líder de um grupo Hykso que partiu do Egito após perder batalhas contra os faraós de Thebas, certamente era seguidor de Baal. Esse deus aparece nas inscrições dos palácios e templos Hyksos, lá no Egito. O segundo Moisés, sacerdote da 18ª dinastia do Egito (aprox. 1350 a.C.), adorava o deus-sol Aten e deixou sua terra em busca dos territórios aliados mais distantes, pois os sacerdotes Egípcios reestabeleceram o politeísmo e extirparam todos os traços do culto de Aten. Os sacerdotes eram ligados à realeza e esse talvez seja o Moisés (seu nome era justamente Moshe) associado com as riquezas registradas no livro do Êxodo, bem estranhas para um povo de escravos que foge pelo deserto.

Tomai do que tendes, uma oferta para o Senhor; cada um, cujo coração é voluntariamente disposto, a trará por oferta alçada ao Senhor: ouro, prata e cobre, azul, púrpura, carmesim, linho fino, pelos de cabras, peles de carneiros, tintas de vermelho, peles de texugos, madeira de acácia, azeite para a luminária, especiarias para o azeite da unção e para o incenso aromático. E pedras de ônix e pedras de engaste para o éfode e para o peitoral. (Êxodo 35.5-9)

Além disso, Moisés era um líder militar. Essa atuação provavelmente se deve ao general Mermoses (= filho de Mer), enviado na mesma época de Moshe para pôr fim a uma rebelião na terra de Kush/Núbia ao sul do Egito. Lá estavam as minas de ouro que forneceram à 18ª dinastia seus grandes tesouros. Há vestígios do exército de Mermoses perto dali, na Etiópia, onde o general Egípcio casou-se com a princesa da poderosa cidade-estado de Sabá. Com a expulsão dos sacerdotes de Aten, Mermoses certamente tornou-se inimigo da nobreza de Thebas e não é impossível que a Etiópia tenha fortalecido relações com reinos mais distantes, como Canaã. Talvez até Mermoses e sua família tenham migrado de uma terra a outra. Na Bíblia, encontramos passagens que de repente se conectam:

Miriã e Arão começaram a criticar Moisés porque ele havia se casado com uma mulher cuxita. (Números 12.1)

A rainha de Sabá soube da fama que Salomão tinha alcançado, graças ao nome do Senhor, e foi a Jerusalém ... Disse ela então ao rei: "... Bendito seja o Senhor, o teu Deus” ... E ela deu ao rei quatro toneladas e duzentos quilos de ouro e grande quantidade de especiarias e pedras preciosas. E nunca mais foram trazidas tantas especiarias quanto as que a rainha de Sabá deu ao rei Salomão. (1ª Reis 10)

Num tempo de guerras entre impérios, seria bem improvável uma rainha viajar tão longe levando uma considerável riqueza e em direção a um reino desconhecido. A influência da cultura Egípcia sobre Israel, supostamente levada pelos vários Moisés, faz-se notar na grande semelhança entre os 10 Mandamentos e um trecho do Livro dos Mortos, conjunto de orações escritas em tumbas para encomendar os espíritos ao Outro Mundo:

Eu não cometi pecado. Não cometi assaltos com violência. Não roubei. Não matei homens e mulheres. Não roubei grãos. Não tirei ofertas. Não roubei as propriedades dos deuses. Não menti. Não levei comida embora. Não proferi maldições. Não cometi adultério. Não me dediquei aos homens. Não fiz ninguém chorar. Não comi o coração. Não ataquei nenhum homem. Não sou um enganador. Não roubei terras cultivadas. Não fui um espião. Não caluniei ninguém. Não fiquei bravo sem justa causa. Não descartei a esposa de nenhum homem. Não me poluí. Não aterrorizei ninguém. Não transgredi a lei. Não fiquei irritado. Não fechei os ouvidos às palavras da verdade. Não blasfemei. Não fui violento. Não agitei de conflitos. Não agi com pressa indevida. Não criei discussões. Não multipliquei minhas palavras ao falar. Não errei. Não fiz nenhum mal. Não fiz feitiçaria contra o rei. Nunca parei o fluxo da água. Nunca levantei a minha voz. Não amaldiçoei os deuses. Não agi com arrogância. Não roubei o pão dos deuses. Não tomei os bolos khenfu dos espíritos dos mortos. Não arruinei o pão de crianças, nem tratei com desprezo o deus da minha cidade. Não matei o gado pertencente a um deus.

Mesmo pensando-se nos tempos de Davi e Salomão, principais figuras da monarquia de Israel, não demorou que os historiadores também reparassem numa incrível semelhança entre o Salmo 104 e o Hino a Aten, do tempo do faraó Akhenaten, do sacerdote Moshe e do general Mermose, cerca de 150 anos após o Êxodo (veja as referências, no final do texto). Basicamente, o Salmo apenas re-nomeia o Deus do hino como YHWH.

ENTRE OS FILHOS DE UR DOS CALDEUS

Falemos agora sobre o longo período pré-monarquia. Para começar, a nomeação de “Ur dos Caldeus” no texto do Gênesis é um sinal de que os autores do texto não eram tão antigos assim. A cidade-estado de Ur, próxima à foz dos rios Tigre e Eufrates, existe desde aprox. 3800 a.C., sendo uma das mais antigas conhecidas. Lá reinou o poderoso Sargão em 2000 a.C., de quem derivou a estória sobre o nascimento de Moisés. Os Caldeus, por outro lado, são um povo que somente se organizou na região de Ur por volta de 1000 a.C., bem depois do Êxodo. Os Caldeus ficaram especialmente conhecidos por seu notório rei Nabucodonosor, que comandou a invasão de Israel em 600 a.C.

O Gênesis nos conta que Abraão chegou em Canaã sob o comando de Deus, saído de Ur. A mitologia de Ur, assim, é a referência mais antiga que temos sobre o(s) deus(es) Israelitas em Canaã. Essa mitologia traz, inclusive, uma versão do Dilúvio. A principal divindade de Ur era El, o Criador, nascido quando o Céu e a Terra se separaram. Furioso, o Céu começou a destruir seus filhos (deuses) sobre a Terra, mais ou menos como El Shaddai exterminando os filhos dos anjos com os humanos (Gênesis 6). Entre esses deuses estavam El e Asherat/Baalat. El atacou o Céu com uma lança e castrou seu pai, ao mesmo tempo afugentando-o. Ele teve então 70 filhos com Asherat, destinados a comandar as nações na Terra. Entre tais filhos estavam Yam (senhor do mar), Mot (a morte), Baal (senhor dos relâmpagos) e Yaweh (senhor do fogo). Reparemos que, no Pentateuco, Yaweh/YHWH faz sua aparição a Moisés num arbusto em chamas, solicita depois que os sacrifícios sejam queimados e finalmente incendeia o altar feito por Elias. Isso para não falar das "línguas de fogo" sobre os apóstolos, no livro de Atos. Tanto Baal quanto Yaweh receberam Canaã como reino, e talvez isso explique Sua forçosa convivência e as intermináveis disputas dos sacerdotes de um de outro nos tempos das monarquias de Israel.

Yam e Baal duelaram pela sucessão de El na hierarquia dos Elohim (deuses). Exército divino contra exército divino, Baal venceu e cortou Yam em pedaços, espalhando-o pelo mundo. Assim surgiram os diversos mares. Baal então casou-se com a própria mãe Asherat e sua mãe/esposa convenceu El a erguer-lhe um palácio. Com seu castelo pronto, Baal começou a tomar todas as cidades humanas e chamou Mot para aterrorizar os que ficassem contra ele. Mot se ofendeu com a ordem e ameaçou devorar Baal, mas o deus-sol transfigurou um jovem humano para a semelhança de Baal, de forma que Mot aniquilou o ser errado.

El interveio pelo filho, mas Mot afirmou que não sabia onde a alma de Baal estava. Asherat, furiosa, lutou com Mot e o destruiu. Quando Baal reapareceu, El refez Mot e requisitou a paz entre os irmãos. Baal ofereceu seus próprios súditos (humanos) a Mot, que novamente se enfureceu, mas foi advertido por El que não deveria tocar no Seu sucessor. Yaweh e os outros deuses somente são citados na mitologia quanto às terras que herdaram.

El se tornou um deus-patrono de Canaã, citado nos nomes de grande parte das cidades, especialmente as mais antigas. Baal e Asherat, também nomeadores de cidade antigas como Byblos, foram cultuados como o deus das tempestade e a deusa dos bosques, respectivamente. O nome de Yaweh, por volta de 3000 a.C., era associado à rota das caravanas de Madiã que passavam pela região vulcânica do oeste da Arábia, onde haviam minas de ouro (a terra de Ofir citada no Gênesis).

O DEUS DAS MONTANHAS

Quando Deus se apresenta a Abraão, pouco depois de 2000 a.C., Ele chama um habitante ou nobre de Ur bem no tempo do poderoso rei Sargão e quando Ur era apontada pelas lendas Sumérias como o ponto de contato entre a Terra e o mundo celestial. Para esse fundador afortunado, Ele se apresenta como El Shaddai. O mesmo nome é usado no livro de Jó, considerado o mais antigo de toda Bíblia.

El claramente é uma referência ao patrono de Ur. Shaddai é uma palavra derivada da língua de Ur, vinda de Shadu (montanha), aparentada com o hebraico Shadé (área selvagem) e o árabe Shaddid (forte). Uma antiga cidade da Síria, entre duas montanhas, usava o nome Shaddai. A palavra era usada no hebraico antigo para especificar fronteiras ou limites, e mais tarde o deus que impunha limites ou delimitava a terra, o céu e as águas, ordenando o caos do mundo. Na Babilônia de Nabucodonosor, um esquema parecido colocava o deus Marduk lutando contra o dragão Tiamat, símbolo do caos. Também Baal combatia Yam, o mar. A referência ao "deus da(s) montanha(s)" reaparece depois inúmeras vezes, no Zeus (também chamado Jove!) dos gregos, com Moisés no Sinai, na recitação do Alcorão, nos deuses Incas, etc.

RESUMO DA VIAGEM

Shaddai provavelmente é o nome mais antigo de deus, associado a uma força ordenadora do mundo que reside nas montanhas sagradas. El criador se tornou El Shaddai, o ordenador e Elyon, aquele que está acima dos deuses. Futuramente, se tornaria o Allah dos Muçulmanos. Dele vieram Baal e Yaweh, guerreiros dos raios e do fogo, que foram misturados pelos vários Moisés ao Aten senhor/criador do Egito. Josias fez a opção por manter o nome YHWH, mas de fato uniu os cultos de El, Aten, Baal e Yaweh, extirpando o nome de Asherat. YHWH (pronúncia Javé) permaneceu, por muitos séculos, como a forma do nome de Deus. Finalmente, Jesus introduziu Abba (pai), que baseou o Cristianismo com Ele mesmo sendo representante e parte de Deus. Mais tarde, temendo pronunciar o nome divino, apareceram formas de substituição como Adonai, Shema, Ha Shem, Kyrios, Theos e Dominus. Longe de desafiar o monoteísmo, essa “linhagem” talvez nos torne mais humildes ao ver que Deus se mostrou ou foi visto de formas bem diferentes pelos homens ao longo do tempo.

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PAPÉIS AMARELADOS

Bethel – wikipedia
Budge EAW, Egyptian book of the dead, The papyrus of Ani – holybooks.com
El (deity) – wikipedia
El Shaddai – wikipedia
Elohim – wikipedia
Elyon – wikipedia
Herzog Z, Deconstructing the walls of Jericho, Ha'aretz Magazine, Oct 29, 1999.
I am that I am – wikipedia
Josiah – wikipedia
Masoretic text – wikipedia
Tetragrammaton – wikipedia
The hidden history of Jehovah – hiddenmisteries.org, 2004
Ur - wikipedia
Yaweh – wikipedia

Um comentário:

  1. O Nome do Altíssimo está gravado na Criação, e expressa o seu carácter de Justiça e Amor!

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