sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

O fim dos profetas


Nos primórdios da história, um belo texto do Alex Carrari foi usurpado. Apenas vestígios de DNA sobraram da obra original. Baseados neles e em fragmentgos do DNA de rãs jurássicas, esse texto foi produzido. Leia-o enquanto ouve uma música estranha e herética¹.

Nos tempos antigos, profetas andavam por aí e eram conhecidos, respeitados como verdadeiros sacerdotes andantes e talvez algo mais do que isso. Como os sacerdotes eles mantinham intimidade como o Todo Poderoso, coisa que outros mortais não podiam. Mas, bem diferente dos sacerdotes, os profetas gastavam parte do seu tempo mantendo intimidade com o povo terreno, de quem muitas vezes ganhavam o seu pão. Se você desejava pedir perdão pelos pecados, podia ir até o sacerdote. Mas, se quisesse saber sobre a cura de um parente ou sobre o fruto da lavoura, era melhor procurar um profeta. E talvez nem fosse preciso ir até ele, pois como eram andantes, os profetas vinham diretamente trazer recados lá da Administração, ainda que nem sempre fossem elogios.

Bem comum era alguém acabar se redimindo ou se arrependendo de algumas condutas após o encontro com o dito profeta. Somos razoavelmente hábeis em nos auto-desculparmos, e acreditamos ter onipotência sobre o que nos diz respeito, por isso o Senhor colocou em nosso meio esses personagens destinados a nos dizer o contrário, e provavelmente aquilo que O ouvimos sussurrar mas não queremos acreditar. Um homem podia fingir ser quem poucas vezes ele na verdade era, usando de covardias e omissões. Por isso o profeta livremente podia sair no seu encalço ou simplesmente aguardar ele onde sabia de antemão que passaria, para ali fazer esse trabalho de aliviar seu inconsciente do pecado, enquanto lhe jogava conscientemente toda a coisa no rosto. Palavreado bonito e delicadeza eram dispensáveis: na verdade, a imagem dos profetas ficava marcada pela sua dureza.

Era interessante a consulta a um profeta. Perguntas elaboradas com alguma sutileza, ele já mostrava por meio delas a resposta que o indivíduo deveria ter dado a mais tempo."Porque desprezaste a palavra do SENHOR, fazendo o mal diante de seus olhos?" Davi se assombrou (2Sm 12).  "Abençoaste o casamento de teu irmão Felipe?" Herodes ficou pálido (Mc 6.17-20). Nesses encontros, que todos adiavam ter, as verdades inconvenientes afloravam e a contrição aparecia. Mordiscando um favo de mel ou tomando um gole de café, o profeta sempre podia soltar um “Agora fale você de você mesmo...” e qualquer homem que soubesse quem ele era iria se apavorar. Quem não soubesse, ficaria apavorado depois. Era semelhante a ouvir essa palavra do seu Chefe, a quem você nunca teve a honra sequer de conhecer pessoalmente. A seguir viriam os frutos da chama divina que lhe ardia o peito, carregados das novidades a respeito de quem estava ali para perguntá-las, ansiando que não fossem tão ruins quanto a simples espera fazia pensar que eram.

Um homem mais precavido podia dar provas concretas de indispensável, insubstituível a harmonia do mundo, podia assinalar sua própria ignorância. Talvez isso o fizesse ser visto como pouco mais que um hominídeo primitivo e individualista, que ocupa seu tempo pelejando pelo pão que perece. Mas não havia verdade alguma, nem utilidade nisso. O profeta estava ali para fazer o que o homem queria que ele fizesse, mas não desejava que fosse feito. Ele estava ali para colocar um ponto final em você como o que ele acreditava ser, mostrando o que realmente era e o que Deus ORDENAVA que ele fosse. A diferença entre as duas coisas podia ser constrangedora: um rei podia ser dito impuro, um rico podia ser chamado de pobre, um homem santo podia ser chamado de víbora. E talvez nem fosse uma acusação, podia ser uma previsão de futuro. Facilmente alguém teria os sonhos completamente quebrados nesse encontro.

Depois de ser anunciado por muitos profetas, foi a vez de Jesus fazer esse papel, quando anunciou aos homens o futuro sobre si mesmo, o Templo e os Últimos Dias, não nessa ordem. O futuro foi revelado a cada um a despeito do que se queria ou imaginava. Pedro foi advertido de que negaria seu mestre. Judas foi avisado de que Jesus sabia de suas intenções. Foram todos avisados sobre os falsos cristos e profetas que enganariam até os escolhidos. Mas Jesus não era apenas um profeta: Ele não vinha apenas trazer notícias do Reino de Deus, vinha implantá-lo. Ele inaugurava uma comunicação privilegiada onde, agora, o próprio Deus nos daria ouvidos (Mt 28.20; Jo 14.13). Os homens aptos a falar diretamente com Ele? Era ao mesmo tempo maravilhoso e aterrador. O Todo Poderoso nos teria sob sua proteção, mas também poderia falar conosco a qualquer hora. Se antes os homens podiam [inutilmente] fugir dos profetas, com Jesus, fugir perdia o significado e se tornava impossível.

João [de Patmos] mostra que Jesus não encerrou a existência dos profetas. No livro de Apocalipse (ou Revelações, muito mais sugestivo) João aparece profetiza oniricamente todo o cenário do fim-do-mundo, explicando o porque de cada vírgula dos textos sagrados, mesmo os que ainda não haviam sido lidos². Era um recado para todo o povo e para 7 grupos cristãos em especial, que tiveram suas virtudes e misérias expostas para os séculos dos séculos. Mas João findava a lista dos que deixaram suas mensagens para serem postas no Livro. Paulo foi contemporâneo dos apóstolos, mas a geração seguinte simplesmente não foi testemunha ocular da passagem de Jesus pela terra, e os profetas então voltaram a ser mensageiros somente entre Deus e aquele que deveria escutá-lo mas se nega ou esqueceu como ouvir.

Andando pela rua, talvez você encontre um desses que Ele chamou para serem mensageiros. Se a tradição continuou (Deus pode até gostar dela, mas não é obrigado a segui-la), você o verá como alguém que depende da ajuda de outros, e que virá a você mesmo que você não o chame. Certamente ele estará longe de casa, se não estiver os homens questionarão como um igual a eles poderia ouvir a Deus e terão feito dele um louco, sem voz ou desonrado (Mc 6.4). Por isso talvez ele apareça de forma singela e discreta, mas virá te lembrar que Deus te ouve, vê e anseia para que você faça o mesmo. "Porque você não ouve? Onde está teu Deus?"Se o seu coração se revolver nessa hora, se você sentir que o Senhor tem algo a lhe dizer, saiba que Ele finalmente vai sorrir, pois chegou a você e será ouvido também.

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¹ Na verdade, Illuminandi é uma banda de metal cristão da Polônia, que existe desde 1998. A sua música combina metal sinfônico (ou seja, rock + instrumentos clássicos), gótico (que valoriza um certa tristeza intimista) e folk (que é outro nome para música de raiz medieval européia). Não é uma combinação única, mas é novidade alguém trazer esse estilo para a música cristã. O nome da música é "W Drodze", que em polonês significa "O Caminho".

Senne dni, w takiej ciszy gdy
Dias sonolentos, naquele silêncio quando

zwyczajnie nikt nie lubi pustki.

ninguém gosta de simplesmente ficar em branco.

I parę słów z jeszcze śpiących ust;
Algumas palavras ainda dormem na boca;

najlepiej wcale bym nie mówi.
e é melhor não falar.

W drodze bez wytchnienia
No caminho, sem parada

ciągle bledną przeszłe dni
os últimos dias ainda se vão

z nadzieją w sobie.
com esperança em você.

W drodze mysli pełne wspomnień
O caminho, cheio de memórias


do ostatnich chwil ...
dos últimos momentos ...

Tam już tylko my...
Não sou só eu ...

Seene dni, w takiej ciszy gdy

Dias sonolentos, no silêncio quando

śnieg już dawno pogrzebane przez okna.

a neve já cobriu a janela.

Oto ja, z drugiej strony można.

Aqui estou eu, mesmo que você não queira.

Będę z tobą aż do końca.
Eu estarei com você até o fim.

W drodze bez ...
No caminho, sem ...


² Os historiadores apontam, em sua maioria, razões para o livro de Apocalipse ter sido escrito nos anos 60 da Era Cristã, quando o imperador Domitiano governava. Essa data também parece ser a da redação das cartas de Paulo às várias igrejas, de forma que João [de Patmos] - que pode ou não ser o mesmo João apóstolo - muito dificilmente teria lido essas cartas.

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