sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Ser ou crescer, eis a questão


Ser "nascido de Deus" significa que uma semente  foi colocada em nós, um princípio da vida eterna. Essa é a doutrina que, como indiquei num estudo anterior, torna completamente IMPOSSÍVEL aceitar o ensino acerca do "Deixe correr e deixe com Deus". É-nos dito que, porque esta semente da nova vida está em nós, não podemos continuarem pecado. A verdade é afirmada categoricamente. É-nos dito que nada podemos fazer, senão entregar-nos ao Senhor. Temos de compreender que Ele colocou um princípio de vida, uma semente, em nós, e que não podemos continuar praticando o pecado porque a semente está em nós; quer dizer, somos nascidos de Deus. Este princípio de vida que Ele colocou em nós tem poder, tem força, muda tudo (e muda mesmo?).

Assim que, se alguém está em Cristo, nova criatura é; as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo. (2 Coríntios 5.17).

Aquela outra idéia segundo a qual o cristão permanece sendo o que sempre foi, mas agora repousa no poder de Deus - idéia colocada nos termos da ilustração do atiçador de chama* - é também uma negação deste ensino acerca da semente. O cristão não é simplesmente alguém que tomou uma decisão, que decidiu seguir a Cristo e fazer isso ou aquilo. Ele o faz, porém o que o leva a fazê-lo é que esta semente da vida eterna foi colocada nele, que ele é nascido de Deus. Há nesse homem algo que é maior do que o homem todo, e este é o novo princípio que vai governar a totalidade da sua vida. Posto que é assim, ele não pode continuar vivendo como vivia. Diz a Bíblia que a princípio ele é apenas um bebê, uma criança, em Cristo. Portanto, surge a questão: como esse bebê pode crescer, como essa criança pode desenvolver-se? Ou, coloquemos a interrogação noutra forma - como é que este princípio de vida, poder e vigor pode ser alimentado, nutrido e desenvolvido e assim fortalecer-se cada vez mais?

A melhor maneira de responder essa pergunta é seguir a linha da analogia sugerida pela terminologia utilizada nas Escrituras. A necessidade óbvia é de comida e bebida. De que é que o bebê recém-nascido necessita acima de tudo? Alimento e água. Necessita de nutrição. Se o bebê há de desenvolver-se, vindo a ser criança, adolescente, homem, precisa de sustento. O bebê recém-nascido é dependente e fraco, e nada pode fazer em seu próprio benefício. Mas virá o dia em que ele terá força, vigor e poder, e será capaz de fazer coisas para si e para outros. O alimento e a água produzem esta mudança. Na vida cristã é exatamente a mesma coisa; e este é um modo como nos tornamos fortes "no Senhor e na força do seu poder".

Como cristãos, recebemos força e poder da semente da vida que é colocada em nós. Todavia a semente terá que crescer e desenvolver-se, e nós temos que tomar medidas, providenciando para que a vida de Deus a nós dada cresça, se desenvolva e constantemente seja cada vez mais forte.

Para mostrar como isso acontece, devemos resumir o ensino que trata deste problema em quase toda parte da Bíblia. Começo falando de comida e bebida porque estas vêm em primeiro lugar. Como as obtemos? O nosso Senhor responde pessoalmente em Jo 6.35:

Aquele que vem a mim não terá fome, e quem crê em mim nunca terá sede". Comida e bebida satisfazem a fome e a sede.

Em Cristo as encontramos, indo a Ele, e perseverando em ir a Ele. "Aquele que vem" - que persevera em vir a Mim - "não terá fome, e quem crê" - quem persevera em crer -"nunca terá sede." No mesmo capítulo, no versículo 53, lemos:

Jesus pois lhes disse: na verdade, na verdade vos digo que, se não comerdes a carne do Filho do homem, e não beberdes o seu sangue, não tereis vida em vós mesmos. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia. Porque a minha carne verdadeiramente é comida, e o meu sangue verdadeiramente é bebida. Quem come a minha carne e bebe o meu sangue permanece em mim e eu nele. Assim como o Pai, que vive, me enviou, e eu vivo pelo (ou por causa do) Pai, assim, quem de mim se alimenta, também viverá por mim.

Aí temos ensino profundo e místico. Certos ouvintes reagiram e disseram: "Duro é este discurso; quem o pode ouvir?" "Do que é que Ele está falando? Como nos pode dar este a sua carne a comer?". Tropeçaram nisso. Na verdade, a passagem nos diz que "muitos dos seus discípulos tornaram para trás, e já não andavam com ele". Não puderam entender as palavras do Senhor e, na verdade, ofenderam-se com elas.

Portanto, estas palavras chegam a nós como uma prova. A nossa reação a estas palavras proclama exatamente o que somos e onde estamos. Nada mais glorioso e maravilhoso jamais foi oferecido aos seres humanos e, todavia, é possível às pessoas rejeitar a mensagem e ter profunda aversão por ela. Parecia que todos O estavam abandonando, pelo que o nosso Senhor voltou-Se para os discípulos e disse: "Quereis vós também retirar-vos?" Pedro, sem entender plenamente o que estava falando, disse: "Senhor, para quem iremos nós? Tu tens as palavras da vida eterna. E nós temos crido e conhecido que tu és o Cristo, o Filho de Deus".

Então, que quer dizer isso? Diz o nosso Senhor que as Suas palavras são espírito, não carne. Ele não está falando de coisas materiais. Está falando de maneira espiritual. Ele está utilizando uma analogia aqui. O que Ele quer dizer, e diz, é: o Pai Me enviou, e Eu vivo por causa do Pai. Vivo pelo Pai, e recebo Minha força, Minha nutrição e Meu poder do Pai. Isto faz parte do que a encarnação envolve. Jesus não tinha deixado de ser o Filho de Deus, mas tinha assumido a natureza humana. Agora estava vivendo a Sua vida como homem, com a natureza humana. Não estava vivendo em termos da Sua divindade; esta continuava nEle, porém Ele não vivia por ela. Estava vivendo uma vida de completa dependência do Seu Pai. Por isso orava com tanta regularidade. Diz Ele: Eu vivo pelo Pai; isto é, do Pai Eu retiro a Minha força, a Minha nutrição, tudo que é Meu. E Ele diz que, de igual maneira, o homem que verdadeiramente crê em Mim, vive por causa de Mim.

Ele Se expressa em termos de comer Sua carne e beber Seu sangue; o que realmente significa assumi-Lo como Senhor, crer nEle como Ele é em toda a Sua plenitude, e daí por diante viver uma vida determinada, dirigida e governada por esta fé nEle, por esta rendição a Ele, por esta confiança nEle e na força do Seu poder. O Senhor fala disso dramaticamente, naqueles termos, a fim de que possamos ver que se trata de algo que eu e você temos de fazer de maneira total e completa. Não basta que digamos: "Sim, eu creio no Senhor Jesus Cristo, cri nEle num dado momento e, desde aquele momento, tenho sido sempre cristão".

A verdadeira fé em Cristo leva a "comer a carne e beber o sangue", quer dizer, realmente comer e beber, mastigar, engolir, assimilar, fazer disso uma parte do seu ser, compreendendo que Ele é o seu Pão da vida. "Eu sou o pão da vida", diz Ele. Ele Se contrasta com o maná do deserto, que era apenas um tipo e uma figura - algo dado para manter o bem estar físico - e, contudo, um grandioso tipo do que Ele ia fazer quando viesse. "Eu sou o pão da vida... se alguém comer deste pão, viverá para sempre", diz Ele. Todo aquele que comer de Mim jamais morrerá, neste sentido espiritual, porque está recebendo vida, torna-se "participante da natureza divina", alimenta-se de um maná celestial. Ele está se alimentando de Mim, está vivendo em Mim, está vivendo por Mim, está vivendo porque Eu Sou o que Sou e realizei a obra que o Pai Me deu.

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* Não tenho idéia do que o autor se referia ao fazer essa analogia, nem pude encontrá-la noutro lugar. Se alguém souber, por favor escreva!

Texto modificado um tantinho só (supostamente para melhor) do texto de D. Martyn Lloyd-Jones em http://www.martynlloyd-jones.com/2010/07/uma-semente-d-martyn-lloyd-jones.html.

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