quarta-feira, 13 de abril de 2011

Realengo



Quando alguém torna-se um assassino? Por mais que tenha pensamentos sobre isso, uma pessoa só é assassino depois de matar. Na 5ª feira 07 de abril foi a vez de Wellington. Ele foi à escola Escola Municipal Tasso da Silveira, Realengo, Rio de Janeiro e atirou o quanto pôde nos alunos que estavam em sala de aula. Recarregava, voltava a atirar, sala por sala. Quando viu-se parado pela bala de um policial, concluiu o plano matando a si mesmo. Digo “plano” porque foi tudo premeditado: havia a arma, havia um enorme estoque de balas, ele havia entrado no local calmamente, falando com as pessoas, pois fora aluno da escola. Havia mesmo mudado a aparência para ficar mais “sociável”. E havia uma carta explicitando como ele queria ser enterrado. Wellington planejava morrer.

Geralmente se pensa que as pessoas perturbadas são imediatistas, desorganizadas. Não são. Wellington demorou preparando o seu fim, e provavelmente nunca saberemos porque ele achou que deveria matar pessoas que nem conhecia. Pessoas com ativação excessiva de uma área interna do cérebro, a amídala, possuem interesse muito aumentado por experiências traumatizantes, condenação religiosa, etc. Mas não saberemos se era o caso.

Ele era muçulmano? Hoje propagandeia-se que todo muçulmano gosta de matar pessoas. São os foras-da-lei da atualidade. Dois indícios quase apontavam para uma ligação com o islamismo: (1) a irmã adotiva de Wellington, Roselane, disse que ele era ligado ao islamismo; (2) Mohammed Atta, um dos terroristas que jogaram os aviões contra o World Trade Center, em 2001, deixou uma carta bem parecida com a de Wellington, também instruindo os cuidados fúnebres que deveria receber. Em especial, a carta de Wellington nada fala do islamismo: é endereçada a cristãos, e dá a entender que ele mesmo era cristão.

Nas duas cartas, tanto um como outro pareciam acreditar que seus atos os fariam mais “merecedores de Deus”, pessoas que deveriam ser respeitadas, que poderiam servir de exemplo para outras. Mais ou menos como se cobrassem uma retribuição e/ou reconhecimento por seu ato maravilhoso. O suicídio de Wellington, assim como de outros atiradores semelhantes, no entanto, mostra que eles não achavam "certo" o que estavam fazendo. Preferiam morrer a ser presos e julgados. Mas achavam necessário fazer o que fizeram.

Jesus alguma vez disse que haveria “grandes cristãos”, que as pessoas os honrariam de alguma forma? Não. Ele mesmo reconheceu que o mundo não o louvaria, fosse por sua atitude, fosse por ser Ele quem era. Segundo Jesus, o mundo ama o que é o mundo. Não haveria glória para os cristãos aqui, como não houve para Ele mesmo. Nos 1os séculos do Cristianismo, muita gente foi trucidada só por ser “cristão”.

Jesus disse que havia formas de ser “mais cristão”. E deu o exemplo: por mais absurdo que nos pareça, seria servindo aos outros. Quem mais servisse em amor a Deus e ao próximo, seria esse maior no reino de Deus (Mt 20.25-28, Mc 10.43-45). Não me parece que Wellington tenha servido ou amado seus semelhantes, no Rio. Muito menos Mohammed Atta, enquanto seqüestrava o avião que jogaria contra o WTC lotado. Jesus também não pediu cuidados mortuários, não disse quem poderia ou não tocar nele, depois de ser açoitado, pregado, humilhado e rasgado pelos judeus e romanos. Que diferença das cartas dos dois suicidas!

Basicamente, o que contradiz os ensinamentos de Jesus é mau. Fosse bom, teria sido observado por ele, como no caso da viúva que deu suas moedas no Templo, ou de tantos mal-agradecidos que Ele curou e perdoou. Deus simplesmente não tem parte com o mau, por isso o que Ele desprezou (o orgulho fariseu, por exemplo), é ruim. As cartas de Wellington e de Mohammed Atta mostram algo seriamente condenável: um auto-orgulho, uma esperança de ser melhor do os demais que só pode derivar do mal que nós (todos) temos dentro da alma, um mal para o qual precisamos buscar tratamento todos os dias da nossa vida.

Wellington e Mohammed Atta deixaram-se ser levados por esse mal, deixaram que ele governasse suas mentes, ou até a sua fragilidade deu brecha para que o mal tomasse forma. Eles não tinham algo que nós também não tenhamos, não fizeram coisas que muitos de nós já não tenhamos pensado em fazer. E a dor que que nós causamos aos nossos semelhantes com as nossas ações diárias? Essa também não é desculpável, só não é tão notória ou destrutiva como a deles foi. Fico pensando em quantos Wellingtons e Attas pelo mundo não poderiam ser devolvidos ao Bom Caminho pela ação de pessoas de Deus que lhes abrissem os olhos, pelo menos. Certamente haverão outros como eles! São pessoas solitárias, com uma lógica destoante do mundo e secreta para quem convive ao seu redor. Como assim secreta?

Encaremos os fatos: nós pouco nos interessamos pelas pessoas com quem convivemos.

A semelhança entre as cartas não é coincidência. Ali ambos externaram o que tinham em seus corações, o que os movia no íntimo. Era o mesmo mal, transtorno da mente ou do espírito: a necessidade de conquistar o favoritismo perante Deus e aos olhos dos homens. Mais essa última que a primeira, pelo menos é o que parece. Se você correr os olhos pelo mundo, verá que há muitos outros empenhados nisso, só usando técnicas diferentes. Poucos matam para serem preferidos por Deus, mas muitos enganam, trapaceiam, reúnem multidões ou até fazem obras de caridade. Onde Jesus fica nisso? Ele virou um utensílio para conseguir atenção, ser visto, ouvido, querido, respeitado e adorado.

Vale a pena examinarmos todos a nós mesmos, encontrar esse mal em nosso coração e pedir a ajuda de Deus para corrigi-lo. Talvez assim causemos menos sofrimento. Talvez possamos ajudar outros como Wellington e Atta, antes que chegue o dia de fazerem o seu mal maior. Será levando o amor de Deus que salvaremos muitos, não de outra forma.

leia as cartas de Wellington e Mohammed Atta

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