Atkins: Você nega que a ciência possa explicar tudo?
Craig: Sim, eu nego!
Atkins: Então o que ela não pode explicar?
Craig: Já que você trouxe isto para o debate, eu tenho vários exemplos, várias coisas que não são cientificamente provadas, mas aceitamos racionalmente. Deixe-me listar 5 delas.
1.Verdades lógicas e matemáticas não podem ser provadas pela ciência. A ciência pressupõe a lógica e a matemática, assim tentar prová-las pela ciência seria argumentar em círculos.
2. Verdades metafísicas: existem outras mentes além da minha? O mundo externo é real? Se o passado não foi criado há cinco minutos aparecendo ser mais velho... São crenças racionais que não podem ser provadas cientificamente.
3. Crenças éticas sobre opiniões de valor não podem ser avaliadas pelo método cientifico. Você não pode provar cientificamente que os nazistas fizeram algo maligno, comparado aos cientistas das democracias ocidentais.
4. O julgamento estético não pode ser acessado pelo método cientifco. O belo ou o bom não podem ser provados cientificamente.
5. E finalmente o mais notável... A PRÓPRIA CIÊNCIA. A ciência não pode ser justificada pelo método cientifico. A ciência é permeada de suposições que não podem ser provadas... Exemplo: a teoria geral da relatividade pressupõe que a velocidade da luz é uma constante entre quaisquer pontos A e B. Mas isso não pode ser estritamente provado. Simplesmente admitmos isto pra manter a teoria.
Nenhuma destas crenças pode ser cientificamente provada. Contudo, são aceitas por todos nós.
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O velho confronto Ciência vs. Religião. De um lado chega o cientista estereotipado: pensador, descrente de tudo o que não possa ser provado. E isso inclui Deus, daí o embate com a os teístas, que tomam Deus por verdade absoluta e princípio. Do outro lado, claro, o defensor da religião que pretende derrotar os argumentos do cientista. Se cada um ficasse no próprio campo, não haveria debate. O cientista trabalharia com a razão e o experimento, enquanto o teísta (para não chamar de religioso) ocuparia seu tempo com a adoração a Deus, sem nada questionar. Simplesmente não teriam assunto para conversar.
Na prática não é assim, os dois interpretam personagens nesse diálogo. Ambos são homens - o cientista assume crenças e o teísta questiona as razões de Deus e postula respostas divinas não incluídas nos textos sagrados.
Quando descobre a solução de um problema (no caso, Einstein e Lorentz explicaram previamente algumas coisas que não se encaixavam na mecânica clássica, que aparecem quando algo se move próximo da velocidade da luz), o cientista postula que aquela solução é geral. Newton talvez tenha sido o primeiro a ir tão longe: no movimento de uma maça, ele suspeitou ver as mesmas leis que regem os movimentos de todos os corpos, inclusive os planetas no espaço sideral. Realmente, não há como provar a validade disso sem examinar todos os corpos no universo. Mas como a nossa mente faz o seu próprio modelo de mundo, quando vemos a maça cair na Terra imaginamos que ela cairia na Lua ou no Sol, talvez com algumas pequenas mudanças.
No outro lado, as tantas teologias por aí são uma mostra de quanto os "religiosos" se esforçam para racionalizar o sagrado, para enxergar os propósitos de Deus além das parábolas e prever as respostas dele para todas as situações do dia-a-dia. Uns deduzem que pessoas tocadas por Deus adquire algo da divindade, passando a operar milagres. Outros refutam isso. Uns vêem manifestações de deus na previsão de fatos futuros, na oração ininteligível, outros argumentam que Deus se mostra nas obras concretas em favor dos demais. Uns sentam com publicanos, outros afastam quem usar roupa diferente. De qualquer forma, são lacunas preenchidas pela razão humana e portanto motivo de disputa entre raciocinadores diferentes.
Mas onde se daria esse jogo misto de cientistas crentes vs. crentes racionais? No vídeo, Atkins usa o mesmo argumento que Newton usou para mostrar a universalidade das leis que ele matematizou. Se a lei prevê com perfeição o movimento da Lua, então não há outras forças agindo além da [gravidade] que ele mesmo postulou. Para Atkins, se a ciência pode explicar tudo sem a necessidade de Deus, então Deus não existe. Mesmo Richard Dawkins não havia ido tão longe ao considerar que, se Deus não é necessário para explicar o mundo, então simplesmente é um Deus inútil, ainda que possa existir. Craig rebate mostrando coisas que a ciência não pode explicar e, suponho, seriam lugares onde Deus se esconde.
Muito tempo atrás, por volta de 1515, Nicolau Copérnico dedicava ao papa seu livro contendo indícios fortes de que a Terra girava ao redor do sol, e não o contrário. Apesar da boa recepção da obra pelo clero, a nova visão do mundo desafiava a suposta "perfeição cósmica circular" suposta / imposta à obra de Deus, e tornava particularmente improvável o relato da tomada de Gibeom pelos israelitas. O resultado foi um grande alvoroço religioso contra Copérnico, que resultou no silenciamento da obra.
Js 10.12-14. Então Josué falou ao SENHOR, no dia em que o SENHOR deu os amorreus nas mãos dos filhos de Israel, e disse na presença dos israelitas: Sol, detém-te em Gibeom, e tu, lua, no vale de Ajalom. E o sol se deteve, e a lua parou, até que o povo se vingou de seus inimigos. Isto não está escrito no livro de Jasher¹? O sol, pois, se deteve no meio do céu, e não se apressou a pôr, quase um dia inteiro. E não houve dia semelhante a este, nem antes nem depois dele, ouvindo o SENHOR assim a voz de um homem; porque o SENHOR pelejava por Israel.
A grande diferença entre os cientistas e o religiosos aparece em pontos como esse, porque cada um emprega bases diferentes de raciocínio. Se é bíblico, para os religiosos está afirmado. Para os cientistas, é preciso demonstrar logicamente como foi feito. A teoria de Copérnico - que pode ser provada experimentalmente - diminui a credibilidade racional do relato de Josué, mas não prova que Deus não tenha feito o que Josué conta. De fato, relatos semelhantes foram coletados pelo historiador grego Heródoto em sua viagem ao Egito, em época condizente. Se é de testemunhas que precisamos... De forma análoga, o princípio da seleção natural, pilar da teoria da evolução de Darwin, é largamente aceito pelos cientistas. Mas um religioso buscaria confirmação disso nas escrituras. Não achando, desconfiaria de tal coisa da mesma forma que os cientistas desconfiam do relato de Josué. Cada qual tem suas bases confiáveis, que simplesmente são distintas. Fé por fé, Craig prefere Deus e Atkins prefere a ciência.
Mas existe um ponto comum entre eles. Ambos buscam uma verdade que melhore a vida as pessoas e até estão sujeitos ao mesmo perigo de andar em círculos. Se Craig confia em Deus mas isso lhe basta, sem que nada seja feito em prol das pessoas, sua fé é vã. Se Atkins confia na ciência e descobrir coisas lhe é o suficiente, sem que isso mude a vida de alguém, também essa ciência é vã. Muitas vezes, os religiosos tentam separar Deus da ciência enfiando ele onde a ciência ainda não chegou, em perguntas sem resposta científica como as cinco de Craig. Da mesma forma, os cientistas apartam a ciência de Deus quando excluem a lógica da forma como Deus age, como se Ele não pudesse usar as leis naturais (a meu crer obras Dele próprio) para chegar a seus intentos.
Se Deus desejasse que o vissem sem um pouco de fé, Ele se mostraria de forma estupenda. E talvez fulminasse a todos nisso, pois mesmo os milagres presenciados pelos israelitas e a estadia de Jesus nesse mundo não bastaram... Presa dentro dessa caixa óssea, a mente humana nem pode saber da existência e outra mente como a sua (embora a aceite e isso baste como prova no dia-a-dia), quanto mais saber sobre Deus (e isso também é aceito racionalmente, para a maioria do mundo, embora de formas distintas). Todos os povos foram habilidosos em criar deuses que refletissem suas necessidades, angústias e até a própria personalidade. Mas crer num Deus fora do homem?
Craig e Atkins ainda fumam seus cachimbos tentando responder logicamente a essa pergunta.
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¹ Nunca houve um profeta chamado Jasher. No hebraico, aparece o título "Sepir Ha Yasher", mas o hebraico não usa pronomes (como é o caso de Ha) antes de nomes próprios. Uma tradução muito melhor do título seria "Livro dos Justos". Sobre esse livro judaico há muitas especulações, inclusive algumas versões forjadas a partir de 1600, com autenticidade defendida por uns e refutada por outros, mas nenhuma versão da época a que o texto bíblico se refere (por volta de 600 a.C.). Uma dessas versões está aqui (em inglês) e um estudo sobre o livro de Jasher está aqui (também em inglês).
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