quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

O Diabo do Novo Testamento


Geralmente se lê que o conceito de Diabo no NT é vago, sendo difícil saber exatamente do que se trata. Um ser chifrudo, vermelho, com rabo pontudo e asas de morcego? Um espírito maligno? Uma antítese de Deus? Um camarada que aparece repetidamente só para ser banido de novo? Quanto a isso, me proponho a escrever algo um pouco mais específico, tentando desenhar o Diabo como ele aparece segundo os autores do NT.

A 1ª aparição do Diabo no NV acontece na ocasião da tentação de Jesus. Assim, vou começar mostrando como Jesus expunha o Diabo.

O DIABO SEGUNDO JESUS

Então foi conduzido Jesus pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo Diabo. (Mt 4.1)

Nessa ocasião, o Diabo recebe também o nome de Tentador, aparece personificado e dialoga com Jesus. Esse é sua única apresentação corpórea, como se Jesus (ou ele) houvesse cruzado pela 1ª e última vez uma fronteira do mundo físico com o mundo espiritual. As 3 tentações (tornar as pedras em pães, jogar-se para que os anjos o salvem e curvar-se ao Diabo) foram uma forma terrível de confronto ao que Jesus significava para o mundo e, na verdade, revelam algo sobre esse Tentador: (1) ele não é cego ao poder de Deus; (2) ele se opõe voluntariamente a esse poder; (3) ele conhece facilmente os desejos mais profundos de cada “vitima” sua, até mesmo Jesus; (4) ele é usado por Deus, pois foi o Espírito Santo quem conduziu Jesus até onde o Tentador estava. Talvez nunca a palavra "Tentador" tenha sido tão bem usada, mas num confronto sempre são ambos os desafiados!

Durante a explicação da parábola dos grãos que se caíram pelo caminho, Jesus cita o Diabo, atribuindo-lhe a ação de retirar o Seu ensino do coração dos homens, impedindo que sejam salvos.

A semente é a palavra de Deus. Os que estão à beira do caminho são os que ouvem; mas logo vem o Diabo e tira-lhe do coração a palavra, para que não suceda que, crendo, sejam salvos. (Lc 8.11-12)

Fica assim questionada a existência do Livre Arbítrio, a que a filosofia ocidental tanto se apega: o homem não pode adquirir a Palavra (ou a Sabedoria, noutros textos) por si mesmo; ela é entregue a ele pelo próprio Deus, o Espírito Santo ou Jesus. Essa é a forma como Salomão e os profetas a adquiriram, originada não da vivência e sim do sobrenatural. Após receber a Palavra, não é o homem quem a esquece ou abandona. Existe uma entidade – o Diabo – que rouba-lhe essa Sabedoria/Ensino com o propósito deliberado de prejudicar a aproximação com Deus. A existência da Sabedoria, que media as ações humanas na Terra, portanto, estaria condicionada a uma batalha de “dar e tirar” que ocorre entre Deus e o Diabo sobre cada ser humano. Onde fica o papel humano nisso?

Em outra parábola – do joio e o trigo – Jesus apresenta o Diabo como o arquiteto de personagens vivos na história da humanidade. Esses Filhos-do-diabo, na simbologia da parábola, são pessoas que não servem para Deus e serão destruídas no final dos tempos:

O que semeia a boa semente é o Filho do homem. O campo é o mundo. A boa semente são os filhos do reino. O joio são os filhos do maligno. O inimigo que o semeou é o Diabo. A ceifa é o fim do mundo, e os celeiros são os anjos. Pois assim como o joio é colhido e queimado no fogo, assim será no fim do mundo. Mandará o Filho do homem os seus anjos, e eles ajuntarão do seu reino todos os que servem de tropeço, e os que praticam a iniqüidade, e lançá-los-ão na fornalha de fogo; ali haverá choro e ranger de dentes. (Mt 13.37-42)

Novamente, aqui o Diabo é um personagem espiritual. Além de impedir os homens de serem salvos, ele possui agentes humanos que promovem a injustiça e o incorreto no mundo que Deus gerou. O que é o incorreto? O trigo produz frutos aproveitáveis para quem ceifa (Deus), o joio produz apenas para si mesmo. Esses "Filhos do maligno" são caracterizados por atrapalhar a obra de Deus (explicitamente o amor prático ao próximo) e por promover iniqüidade/desigualdade entre os homens.

Embora o Diabo possa reconhecer a ação de Deus, Jesus expõe que ele não é capaz de pensar senão como os homens mesmo pensam. Em sua falha como anjo, o Diabo simplesmente fica restrito à pequena compreensão dos homens acerca dos modos como Deus atua:

E Pedro, tomando-o à parte, começou a repreendê-lo, dizendo: Tenha Deus compaixão de ti, Senhor; isso de modo nenhum te acontecerá. Ele, porém, voltando-se, disse a Pedro: Para trás de mim, Satanás, que me serves de escândalo; porque não estás pensando nas coisas que são de Deus, mas sim nas que são dos homens. (Mt 16.22-23)

Nessa passagem, Jesus vê o Diabo agindo sobre Pedro e adverte (ambos?) sobre a necessidade do sacrifício de si mesmo, quando Pedro colocava isso como oposição à compaixão de Deus. Se esse sacrifício não ocorresse, não haveria a superação da morte - uma barreira entre os homens e Deus instituída por Ele mesmo após o pecado de Adão. Mas claro, o Diabo/Satanás não poderia saber disso. Ele permanece condicionado à prioridade da carne, como diria Paulo mais tarde.

Além de usar pessoas como cúmplices em sua prática de desigualdade, o Diabo também é apontado como um infligidor de males sobre os homens:

E estava ali [na sinagoga] uma mulher que tinha um espírito de enfermidade havia já dezoito anos; e andava encurvada, e não podia de modo algum endireitar-se. Vendo-a Jesus, chamou-a, e disse-lhe: Mulher, estás livre da tua enfermidade; e impôs-lhe as mãos e imediatamente ela se endireitou, e glorificava a Deus. Então o chefe da sinagoga, indignado porque Jesus curara no sábado, tomando a palavra disse à multidão: Seis dias há em que se deve trabalhar; vinde, pois, neles para serdes curados, e não no dia de sábado. Respondeu-lhe, porém, o Senhor: Hipócritas, no sábado não desprende da manjedoura cada um de vós o seu boi, ou jumento, para o levar a beber? E não devia ser solta desta prisão, no dia de sábado, esta que é filha de Abraão, a qual há dezoito anos Satanás tinha presa? (Lc 13.11-16)

A única prisão que podemos vislumbrar aqui é um enfermidade ortopédica de longa duração, que fazia a mulher permanecer encurvada. Satanás a tinha presa nessa condição, e Jesus prontamente a curou/libertou. Assim, o exercício da "cura" é mostrado como uma "libertação espiritual", embora o que chamamos de espiritual seja aqui largamente palpável. Mais do que isso, o "dia do Senhor" ou Shabat (Sábado) é apresentado aos fariseus HIPÓCRITAS como algo além do serviço religioso. Afinal, certas coisas não podem deixar de ser feitas mesmo no Shabat!

Em sua série de parábolas para o povo inculto, Jesus explica o critério de seleção a ser usado para separar os Filhos do Reino (chamados de carneiros) dos Filhos do Diabo (chamados de bodes):

E responder-lhes-á o Rei: Em verdade vos digo que, sempre que o fizestes a um destes meus irmãos, mesmo dos mais pequeninos, a mim o fizestes. Então dirá também aos que estiverem à sua esquerda: Apartai-vos de mim, malditos, para o fogo eterno, preparado para o Diabo e seus anjos. Porque tive fome, e não me destes de comer; tive sede, e não me destes de beber; era forasteiro, e não me acolhestes; estava nu, e não me vestistes; enfermo, e na prisão, e não me visitastes. Então também estes perguntarão: Senhor, quando te vimos com fome, ou com sede, ou forasteiro, ou nu, ou enfermo, ou na prisão, e não te servimos? Ao que lhes responderá: Em verdade vos digo que, sempre que o deixaste de fazer a um destes mais pequeninos, deixastes de o fazer a mim. E irão eles para o castigo eterno. (Mt 25.40-46)

Ele reafirma, assim e de forma portentosa, que o “amor ao próximo” é um mandamento decisivo. Amar ao próximo é amar a Ele mesmo, é amar a Deus. Quem não o faz pode não ser um Filho do Diabo, mas vai se juntar a ele no castigo do fim dos tempos. E não se trata de praticar amor "a Deus", mas de praticar amor "a todos os homens", pois o que fazemos "a um desses irmãos, mesmo dos mais pequeninos" fazemos "a Ele". Jesus dá um significado totalmente humano ao conceito de onipresença.

Outra aparição do Diabo se dá na mesa da Última Ceia. Jesus discute com Pedro e aponta Judas como um diabo (o Diabo, em algumas traduções).

Respondeu-lhes Jesus: Não vos escolhi a vós os doze? Contudo um de vós é o diabo. Referia-se a Judas, filho de Simão Iscariotes; porque era ele o que o havia de entregar, sendo um dos doze. (Jo 6.70-71)

A menos que pensemos em Judas [Iscariotes] sentado à mesa com chifres e uma cauda saliente (o que tornaria bem insólita a famosa pintura de Leonardo da Vinci), ou num caso de possessão demoníaca a que Jesus se privou de resolver, o Diabo não é aqui senão um ser qualquer da carne e osso. E qualquer um pode ser um diabo quando afasta os homens de Deus.

Repare que a atitude de Judas, apesar de repugnante, estava predita em profecias de séculos antes, era prevista por Jesus e era completamente necessária à efetivação da sua obra neste mundo. Em outras palavras, embora Judas fosse o/um diabo, ele estava em perfeito alinhamento com a vontade divina! Seu pecado, apesar disso, era claro: ele “decidira” afastar os homens de Deus. “Escolhera” deixar o que foi ensinado, cultuar algo acima de Jesus e o privar de seu amor. Embora toda a cristandade sempre tenha tomado Judas por contra-exemplo de boa conduta, esse NÃO É um pecado difícil de cometer! Em especial, ele é o simbolo de que o Diabo roubou de alguém a Sabedoria e o tornou um de seus Filhos que agem para a desigualdade entre os homens e egoisticamente para o próprio proveito. Você o faz todas as vezes que não pensa em Deus e todas as vezes em que falta com o amor incondicional a alguém. Ok, Judas?

Ao mesmo tempo em que pode ser um homem qualquer, o Diabo é um ser capaz de se alojar no interior dos homens. E embora assim ele atue, não pode deixar de fazê-lo segundo o mandar de Jesus:

Em verdade, em verdade vos digo que um de vós me há de trair. ... Aquele discípulo, recostando-se assim ao peito de Jesus, perguntou-lhe: Senhor, quem é? Respondeu Jesus: É aquele a quem eu der o pedaço de pão molhado. Tendo, pois, molhado um bocado de pão, deu-o a Judas, filho de Simão Iscariotes. E, logo após o bocado, entrou nele Satanás. Disse-lhe, pois, Jesus: O que fazes, faze-o depressa. (Jo 13.21-27)

Dessa forma, "ser um diabo" e "estar possuído pelo Diabo" parecem ser exatamente a mesma coisa, ao menos segundo a descrição dos evangelistas (e de Jesus). Não parecem existir vários diabos, mas apenas imagens de um mesmo ser espiritual, capaz de comandar os homens e arrumar aliados entre eles.

Ainda na mesa da Última Ceia, Jesus também se refere ao Diabo como personagem de um mundo espiritual onde o destino dos homens é decidido. Agora o personagem não é Judas (filho do Diabo), mas Pedro (vítima do Diabo).

Simão, Simão, eis que Satanás vos pediu para vos cirandar como trigo, mas eu roguei por ti, para que a tua fé não desfaleça. E tu, quando te converteres, fortalece teus irmãos. (Lc 22.31-32)

Reparemos que Satanás também pediu (a Deus) o sofrimento de Jó. Nessa 2ª ocasião, entretanto, Jesus interviu contra o sofrimento de Pedro, a fim de manter a sua fé. Novamente, temos o futuro dos homens sendo decidido num outro plano, por seres que não controlamos. E o Diabo, outra vez, pede (a Deus) pelo sofrimento humano. Quem falaria a nosso favor senão Jesus?

Mas Ele avisa que alguns homens de fato preferem seguir ao Diabo, porque ele lhes garante poder (e miséria aos demais). Jesus dá ênfase à associação entre os homens e o Diabo quando prega em frente ao Templo, após salvar a vida de uma mulher que iam apedrejar. Ao ser confrontado pelos Fariseus, ele os questiona: “Se eu vim de Deus e não credes em mim, quem é vosso pai?

Bem sei que sois descendência de Abraão; contudo, procurais matar-me, porque a minha palavra não encontra lugar em vós. Eu falo do que vi junto de meu Pai; e vós fazeis o que também ouvistes de vosso pai. Responderam-lhe: Nosso pai é Abraão. Disse-lhes Jesus: Se sois filhos de Abraão, fazei as obras de Abraão. Mas agora procurais matar-me, a mim que vos falei a verdade que de Deus ouvi; isso Abraão não fez. Vós fazeis as obras de vosso pai.

Replicaram-lhe eles: Nós não somos nascidos de prostituição; temos um Pai, que é Deus. Respondeu-lhes Jesus: Se Deus fosse o vosso Pai, vós me amaríeis, porque eu saí e vim de Deus; pois não vim de mim mesmo, mas ele me enviou. Por que não compreendeis a minha linguagem? É porque não podeis ouvir a minha palavra. Vós tendes por pai o Diabo, e quereis satisfazer os desejos de vosso pai; ele é homicida desde o princípio, e nunca se firmou na verdade, porque nele não há verdade; quando ele profere mentira, fala do que lhe é próprio; porque é mentiroso, e pai da mentira. (Jo 8.37-44)

Aqui, ao invés de personificar o Diabo, ele novamente o mostra COMO PAI das pessoas. O Diabo dentro delas deseja matar o próximo e mentir. O Deus dentro das pessoas, por outro lado, deseja que amem ao semelhante. Se alguém mente, se acusa, se nega o amor, então essa pessoa é um filho do Diabo, um daqueles para os quais está preparado o castigo eterno. Os filhos do Diabo não podem ouvir o que Jesus ensina, porque isso não faz parte deles!

De certa forma, Jesus separa os homens em filhos de Deus e filhos do Diabo, sem mencionar a participação do homem nessa divisão. Aparentemente, tal escolha só depende de forças sobrenaturais. Mas ele também não elege critérios objetivos para distinguir uns dos outros: a árvore má se conhecerá por seus frutos.

DEPOIS DE JESUS

Alheios ao que acontece no plano onde os destinos são decididos, os apóstolos pareciam menos sensíveis ao contato com o Diabo do que Jesus. Ele não era realmente um inimigo visível... exceto pelas suas obras mais explícitas de sofrimento entre os homens. Os apóstolos propagaram o conceito de um Diabo inimigo ou entidade opressora, conforme mostra Lucas em sua descrição das primeiras pregações.

Então Pedro, tomando a palavra, disse: Na verdade reconheço que Deus não faz acepção de pessoas; mas que lhe é aceitável aquele que, em qualquer nação, o teme e pratica o que é justo. A palavra que ele enviou aos filhos de Israel, anunciando a paz por Jesus Cristo (este é o Senhor de todos). Esta palavra, vós bem sabeis, foi proclamada por toda a Judéia, começando pela Galiléia, depois do batismo que João pregou, concernente a Jesus de Nazaré, como Deus O ungiu com o Espírito Santo e com poder; O qual andou por toda parte, fazendo o bem e curando a todos os oprimidos do Diabo, porque Deus era com Ele. (Atos 10.34-38)

A dúvida de Pedro quanto a pregar para os gentios é notavelmente semelhante à parábola do senhor que arrendou suas terras a vinhateiros. Mandando seus empregados duas vezes, foram expulsos ou mortos pelos que estavam nas terras. Mandando o filho, este foi morto. E finalmente, ele destruiria os vinhateiros e arrendaria as terras a outros... como os gentios. Reparemos que, aqui, o Diabo não está DENTRO dos homens, mas é EXTERNO a eles, como no Velho Testamento. O Diabo é um inimigo que aflige aos homens (portanto temei-o!) e a quem Jesus combateu por toda parte. De forma curiosa, o  medo do Diabo (e não o Ensino de Jesus) foi um dos pilares para a propagação do Cristianismo nos séculos que se seguiram à cristianização de Roma.

O conceito de Filho-do-diabo ressurgiu após Jesus como alguém que afasta os homens da Palavra de Deus (conceito antes atribuído ao próprio Diabo).

Havendo atravessado a ilha toda até Pafos, acharam um certo mago, falso profeta, judeu, chamado Bar-Jesus, que estava com o procônsul Sérgio Paulo, homem sensato. Este chamou a Barnabé e Saulo e mostrou desejo de ouvir a palavra de Deus. Mas resistia-lhes Elimas, o encantador (porque assim se interpreta o seu nome), procurando desviar a fé do procônsul. Todavia Saulo, também chamado Paulo, cheio do Espírito Santo, fitando os olhos nele, disse: ó filho do diabo, cheio de todo o engano e de toda a malícia, inimigo de toda a justiça, não cessarás de perverter os caminhos retos do Senhor? Agora eis a mão do Senhor sobre ti, e ficarás cego, sem ver o sol por algum tempo. Imediatamente caiu sobre ele uma névoa e trevas e, andando à roda, procurava quem o guiasse pela mão. (Atos 13.6-13.11)

Não é desprezível que o tal mago utilizasse o nome Bar-Jesus (filho de Jesus) quando a fama de Jesus já se espalhara pela Grécia. Um filho-de-Jesus talvez fosse capaz de fazer os milagres que Jesus fizera, seria associado ao poder sobrenatural. Mas, aparentemente, esse indivíduo estava longe de demonstrar o amor que Jesus demonstrara e, por isso mesmo, usava o nome do Senhor para seus próprios interesses (afinal, um procônsul romano era um homem rico). Repare que o mago tentava afastar o procônsul dos ensinamentos de Paulo acerca da necessidade de amor e fé!

Tomando como referência o castigo imposto por Paulo, Elimas certamente era um visionário comandando decisões do procônsul com base nos seus interesses ou aleatoriamente. Cego, sua demonstração visionária ficaria invalidada. Mas quem não encontra visionários ainda hoje, dois milênios depois?

No capítulo 4 de sua carta aos cristãos de Éfeso, Paulo também mostra o Diabo DENTRO dos homens, na forma de comportamentos (ou frutos) como mentira, ira, roubo, falta de amor e ofensas.

... deixai a mentira, e falai a verdade cada um com o seu próximo, ... Irai-vos, e não pequeis; não se ponha o sol sobre a vossa ira; nem deis lugar ao Diabo. Aquele que furtava, não furte mais, ... para que tenha o que repartir com o que tem necessidade. Não saia da vossa boca nenhuma palavra torpe, mas só a que seja boa para a necessária edificação... Não entristeçais o Espírito Santo de Deus... Toda a amargura, e cólera, e ira, e gritaria, e blasfêmia sejam tiradas dentre vós, bem como toda a malícia. Antes sede bondosos uns para com os outros, compassivos, perdoando-vos uns aos outros, como também Deus vos perdoou em Cristo.

Como Paulo, João enxergou o Diabo DENTRO das pessoas e as impulsionaria ao pecado. Ele distinguia os que são Filhos-do-diabo daqueles que são Filhos-de-Deus. Num mudo de pecadores, os Filhos-de-Deus estariam a melhorar-se enquanto os Filhos-do-diabo estariam acomodados em sua situação.

Todo o que permanece nele [em Jesus] não vive pecando; todo o que vive pecando não O viu nem O conhece. Filhinhos, ninguém vos engane; quem pratica a justiça é justo, assim como Ele é justo; quem comete pecado é do Diabo; porque o Diabo peca desde o princípio. Para isto o Filho de Deus se manifestou: para destruir as obras do Diabo. Aquele que é nascido de Deus não peca habitualmente; porque a semente de Deus permanece nele, e não pode continuar no pecado, porque é nascido de Deus. Nisto são manifestos os filhos de Deus, e os filhos do Diabo: quem não pratica a justiça não é de Deus, nem o que não ama a seu irmão. (1Jo 3.3-10)

Novamente, o Diabo aqui é uma entidade que controla o agir dos homens. Aqueles nascidos de Deus afastam-se do pecado, ainda que pequem às vezes. Não lhes foi dado escolher, eles simplesmente são assim. Já os Filhos-do-diabo incorrem sempre no pecado porque essa é a sua natureza, sem que também lhes seja dado escolher.

O DIABO NA IGREJA

Em sua carta cheia de recomendações de austeridade pública aos que se interessavam pelo bispado (única hierarquia existente então, dentro de um grupo perseguido por Roma), Timóteo alerta para a presença do Diabo DENTRO DA IGREJA: a soberba, ou “condenação do Diabo”, nas palavras dele. Identificado no livro do Apocalipse como a mais brilhante das estrelas e depois como o Grande Dragão, o Diabo teria por primeiro pecado justamente a soberba diante de Deus.

Isso levou, curiosamente, a dois movimentos contrários dentro da Igreja nos séculos seguintes. Por um lado o culto cada vez maior das figuras de autoridade POLÍTICA, e por outro lado a demonstração de humildade através da renegação das próprias vontades. Para se afastarem do Diabo DENTRO deles, muitos religiosos se deram a dietas sofríveis, falta de repouso, falta de higiene, auto-flagelação e auto-encarceramento (às vezes em cubículos sem luz). Outros se deram a um trabalho meticuloso de austeridade pública, incluindo a aliança aos ricos e poderosos, sempre louvados pelo povo. Sem que isso de forma alguma se convertesse em amor do próximo...

OUTRAS VISÕES DIABÓLICAS

O autor de Hebreus enxergou o Diabo no medo da morte. Pelo medo da morte, os homens preferem destruir seu semelhante (por exemplo roubando-os) do que ajudá-lo (o que significaria esvair seus recursos). Mais do que temer ao Diabo, os homens certamente temem a morte. Fomos feitos para agir assim! Mas ao provar a morte e retornar, Jesus se tornou o símbolo de que “morrer não é tão ruim assim”, estendendo uma esperança para além do fim. Sem dúvida isso motivou os cristãos de Roma a morrerem por sua fé, no que ficou conhecido como Era dos Mártires.

Portanto, visto como os filhos são participantes comuns de carne e sangue, também ele semelhantemente participou das mesmas coisas, para que pela morte derrotasse aquele que tinha o poder da morte, isto é, o Diabo; e livrasse todos aqueles que, com medo da morte, estavam por toda a vida sujeitos à escravidão. (Hb 2.14-15)

Tiago, em sua ânsia por tornar o Cristianismo em prática, tentou desmistificar totalmente o Diabo como entidade temível. Segundo ele, de nada adiantava fugir das entidades espirituais e deixar o próximo, a quem Jesus tanto pregou amor.

Deus resiste aos soberbos; dá, porém, graça aos humildes. Sujeitai-vos, pois, a Deus; mas resisti ao Diabo, e ele fugirá de vós. (Tg 4.6-7)

Ele fugirá de vós” simplesmente coloca o Diabo abaixo dos humanos. Essa personificação rápida que Tiago faz é a único desvio que ele faz da necessidade absoluta do amor entre os homens como sinal de fé em Deus. Afinal, uma Igreja estava se estruturando, e talvez fosse possível ser um Filho-de-Deus nos cultos entre 4 paredes. Tiago argumentava que não: para ele, o Diabo era não manifestar o amor. Para Pedro, grande pregador, por outro lado o Diabo era abdicar da fé por medo da repressão romana.

Humilhai-vos, pois, debaixo da potente mão de Deus, para que a seu tempo vos exalte; lançando sobre ele toda a vossa ansiedade, porque ele tem cuidado de vós. Sede sóbrios, vigiai. O vosso adversário, o Diabo, anda em derredor, rugindo como leão, e procurando a quem possa tragar; ao qual resisti firmes na fé, sabendo que os mesmos sofrimentos estão-se cumprindo entre os vossos irmãos no mundo. (1Pe 5.6-9)

Reparemos que Tiago e Pedro concordavam quanto a colocar o Diabo dentro das pessoas; segundo Tiago o Diabo se manifestava pela falta de boas atitudes, mas Pedro o via na tomada de atitudes erradas, em especial nas atitudes covardes (os galos que cantem isso!).

O DIABO EM TODO MUNDO

Central à distinção dos "bons frutos" e os "maus frutos" está o conceito de pecado. Pecar é ir contra a lei divina. No Novo Testamento, pecar é pouco amar a Deus ou ao próximo. A incorrência repetitiva nesse erro - ou mal fruto - seria a marca dos Filhos-do-diabo. A conversão a que João (batista) e Jesus clamavam seria a verdadeira transmutação religiosa, um possível Filho-do-diabo tornar-se um Filho-de-Deus. No entanto, freqüentemente os Filhos-de-Deus são referidos como “eleitos”, no sentido de que para eles JÁ ESTÁ preparado um lugar junto ao Pai, mesmo que ainda estejam aprisionados pelo Diabo como TODOS os demais.

Ora, numa grande casa, não somente há vasos de ouro e de prata, mas também de madeira e de barro; e uns, na verdade, para uso honroso, outros, porém, para uso desonroso. Se, pois, alguém se purificar destas coisas [ou seja, da injustiça], será vaso para honra, santificado e útil ao Senhor, preparado para toda boa obra. Foge também das paixões da mocidade, e segue a justiça, a fé, o amor, a paz com os que, de coração puro, invocam o Senhor. E rejeita as questões tolas e desassisadas, sabendo que geram contendas. Ao servo do Senhor não convém contender, mas sim ser brando para com todos, apto para ensinar, paciente, corrigindo com mansidão os que resistem, na esperança de que Deus lhes conceda o arrependimento para conhecerem plenamente a verdade, e que se desprendam dos laços do Diabo (por quem haviam sido presos), para cumprirem a vontade de Deus. (2Tm 2.20-26)

Vemos pois que o poderio do Diabo se estende a duas classes de homens: os Filhos-de-Deus, prisioneiros, que serão salvos quando se purificarem, e os Filhos-do-diabo, que se unem ao Diabo em afastar os homens de Deus e produzir sofrimento, e para os quais também está reservado o inferno. Quanto aos prisioneiros, Pedro (o valente) adverte para a possibilidade de que “percam a salvação” caso se intimidem pelo sofrimento destinado aos Filhos-de-Deus em sua vida terrena: "O vosso adversário, o Diabo, anda em derredor, rugindo como leão, e procurando a quem possa tragar..."(1Pe 5.8-9)

Uma curiosa explanação de comportamento “puro” que o cristão deve ter sai do livro de Judas (Tadeu), quando cita uma passagem do livro de Enoque:

Contudo, semelhantemente também estes falsos mestres [de Sodoma, Gomorra e cidades vizinhas], sonhando, contaminam a sua carne, rejeitam toda autoridade e blasfemam das dignidades. Mas quando o arcanjo Miguel, discutindo com o Diabo, disputava a respeito do corpo de Moisés, não ousou pronunciar contra ele juízo de maldição, mas disse: O Senhor te repreenda. Estes, porém, blasfemam de tudo o que não entendem; e, naquilo que compreendem de modo natural, como os seres irracionais, mesmo nisso se corrompem. (Jd 8-10)

Jamais um cristão pronuncie maldição, se mesmo ao Diabo isso não foi direcionado!

REVELAÇÕES SOBRE O DIABO

Nas versões da Bíblia em inglês, o livro Apocalipse chama-se Revelações. Lembrando que o título dos livros bíblicos foi colocado pelos copiadores e não existe um título original, o Apocalipse conta alguns detalhes velho-testamentários sobre o Diabo. Detalhes que não foram "revelados" sequer a Moisés, mas fizeram parte das elaboradas visões de João (de Patmos).

1. O Diabo se infiltrou na Igreja através da aparência de santidade dos judeus

Ao anjo da igreja em Esmirna escreve: Isto diz o primeiro e o último, que foi morto e reviveu: Conheço a tua tribulação e a tua pobreza (mas tu és rico), e a blasfêmia dos que dizem ser judeus, e não o são, porém são sinagoga de Satanás. (Ap 2.8-9)

2. O Diabo estava associado à perseguição romana contra os cristãos

Não temas o que hás de padecer. Eis que o Diabo está para lançar alguns de vós na prisão, para que sejais provados; e tereis uma tribulação de dez dias. Sê fiel até a morte, e dar-te-ei a coroa da vida. (Ap 2.10)

3. O Diabo habitava em Pérgamo

Ao anjo da igreja em Pérgamo escreve: Isto diz aquele que tem a espada aguda de dois gumes: Sei onde habitas, que é onde está o trono de Satanás; mas retivestes o meu nome e não negaste a minha fé, mesmo nos dias de Antipas, minha fiel testemunha, o qual foi morto entre vós, onde Satanás habita. (Ap 2.12-13)

Essa inscrição pode certamente estar ligada ao gigantesco trono-altar erguido para César Augusto nos anos que precederam o nascimento de Jesus. Augusto foi famoso por sua oposição à cultura judaica e sobretudo a sacralidade do Templo.

4. O Diabo era um grande dragão habitando nos céus. Ao ser derrubado, ele vaio para a Terra

E foi precipitado o grande dragão, a antiga serpente, que se chama o Diabo e Satanás, que engana todo o mundo; foi precipitado na terra, e os seus anjos foram precipitados com ele. ... Pelo que alegrai-vos, ó céus, e vós que neles habitais. Mas ai da terra e do mar! Porque o Diabo desceu a vós com grande ira, sabendo que pouco tempo lhe resta. (Ap 12.9-12)

5. O Diabo foi a aprisionado no Inferno por 1000 anos, e então será solto

Essa profecia já rendeu muitos anúncios apocalípticos nas viradas-de-milênio. A numerologia judaica, entretanto, era muito mais voltada a expressar coisas grandes e pequenas do que a retratar matematicamente as quantias. Quarenta era geralmente o numeral associado a quantidades grandes.

E vi descer do céu um anjo, que tinha a chave do abismo e uma grande cadeia na sua mão. Ele prendeu o dragão, a antiga serpente, que é o Diabo e Satanás, e o amarrou por mil anos. Lançou-o no abismo, o qual fechou e selou sobre ele, para que não enganasse mais as nações até que os mil anos se completassem. Depois disto é necessário que ele seja solto por um pouco de tempo. (Ap 20.1-3)

6. Ao escapar, o Diabo reunirá cidades para uma batalha

Ora, quando se completarem os mil anos, Satanás será solto da sua prisão, e sairá a enganar as nações que estão nos quatro cantos da terra, Gogue e Magogue, cujo número é como a areia do mar, a fim de ajuntá-las para a batalha. (Ap 20.7-8)

Ezequiel profetizou sobre a vinda de um terrível rei, Gogue, da terra de Magogue, para opor o povo restaurado de Deus. Os capítulos 38 e 39 descrevem a preparação dos exércitos que apoiaram Gogue, o seu ataque contra o povo de Deus e a sua repentina derrota por Deus. As nações que iam participar com Gogue na batalha representam diversos povos gentios. É interessante notar que a maioria desses nomes vem de Gênesis 10, das listas de descendentes de Jafé e Cam. Nenhum deles se encontra na lista dos descendentes de Sem.

A linhagem da promessa é traçada através de Sem. Abraão, Davi e Jesus são descendentes de Sem. Jafé e Cam, por sua vez, eram antepassados de muitas nações ímpias, conhecidas geralmente como gentios. Essas informações esclarecem para nós a simbologia de Ezequiel 38 e 39. Os exércitos de Gogue de Magogue representam os inimigos do povo de Deus tentando derrubar Israel restaurado.

Nada no contexto (um livro que usa um estilo apocalíptico) sugere que Gogue seria uma determinada pessoa histórica. Capítulo 37 é simbólico (ele fala da ressurreição de pessoas num vale cheio de ossos secos). Capítulos 40-48, também, são simbólicos (falam de uma cidade especial e um templo figurado que representam a presença de Deus no meio de seu povo redimido). No mesmo estilo, o profeta usa Gogue para representar a ameaça dos ímpios que tentariam derrotar o reino de Deus.

7. Durante a perseguição da Igreja por Roma, o papel do Diabo era fazer com que os cristãos desistissem de sua fé

Por isso também, não podendo eu esperar mais, mandei saber da vossa fé, receando que o tentador vos tivesse tentado, e o nosso trabalho se houvesse tornado inútil. Mas agora que Timóteo acaba de regressar do vosso meio, trazendo-nos boas notícias da vossa fé e do vosso amor, dizendo que sempre nos tendes em afetuosa lembrança, anelando ver-nos assim como nós também a vós; por isso, irmãos, em toda a nossa necessidade e tribulação, ficamos consolados acerca de vós, pela vossa fé, porque agora vivemos, se estais firmes no Senhor. (1Ts 3.5-9)

Sem dúvida, essa seria uma ocupação aprazível ao Diabo.

DÁ PRA MÓ DI OIÁ AQUI Ó

O Que a Bíblia Diz?

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