domingo, 18 de setembro de 2011

Entre simplórios e cultos


texto de Daniel Clós Cesar

Eu tenho uma teoria. apenas uma teoria… não doutrina. Posso?

Minha formação acadêmica é de professor (o que não é grande coisa no Brasil, eu sei disso). Hoje já não atuo mais como docente, mas na coordenação acadêmica em um Instituto Federal, que por ser federal, dispõe de muitos recursos que outras instituições públicas (estaduais e municipais) sequer imaginam ter, mesmo na próxima década. Mas também trabalhei em lugares bem mais, digamos, acanhados… e por isso, apenas por isso e mais um monte de leitura especializada que me apoia… posso pensar nessa teoria.

O problema fundamental da igreja (as pessoas que são corpo), certamente é o afastamento do Evangelho apostólico para um evangelho humanista. Mas, junto a isso, outros problemas são associados.

Pesquisas brasileiras, apontam que 75% dos brasileiros são analfabetos funcionais (você pode ler sobre estas pesquisas clicando aqui e aqui, não as tirei da minha cabeça). Trocando por números mais palpáveis, significa que a cada 4 brasileiros, 3… sim, TRÊS, são analfabetos funcionais (em diferentes graus, é claro). Isso significa também, que dos 190 milhões de brasileiros, 142 milhões são analfabetos funcionais.

Ora… mas o que é isso, cara pálida?

O analfabeto funcional é uma pessoa que consegue decodificar os sinais (letras), ler frases, textos e palavras, mas, não consegue interpretar. Falta-lhe a habilidade de interpretação de textos, que adiquire-se com a prática da leitura e aprofundamento de estudos, duas coisas pouco usuais na sociedade ocidental tupiniquim. Lê-se pouco e investe-se mais em cirurgia plástica que em educação.

Assim, não por culpa deles… mas do ensino no Brasil que é precário… e dependendo das cidades, longe dos grande centros urbanos, tal analfabetismo atinge inclusive o ensino privado. A maioria dos professores brasileiros possuem apenas a formação básica de sua profissão (graduação), e milhões de brasileiros sabem ler, mas não entendem o que lêem.

O mesmo ocorre dentro da igreja, afinal, são os mesmos brasileiros. A Bíblia tornou-se chata, cansativa e complicada. Sim, isso é falta de uma vida espiritual e sim… isso é apostasia… mas também, menos importante mas com alguma importância… líderes evangélicos descobriram que não é preciso se dedicar muito ao estudo da Palavra e no conhecimento do Santo Deus, porque seus seguidores também não o fazem… pelo contrário, esperam que alguém faça por eles… esperam que outro decodifique e interprete.

Desse modo, a pregação ilustrada com muitos contos humorísticos, fatos do cotidiano, performances e malabarismos, “atingem” objetivos que um pregação fundamentada na Palavra não atingiria… pois poucos entenderiam o que se diz.

Esse texto não é… e também é ao mesmo… uma auto-defesa. Nós que regularmente escrevemos e publicamos textos na internet percebemos, a cada dia, uma piora no fazer-se entender. A cada texto que escrevo, percebo a constante necessidade, não de adaptar o texto, mas de construí-lo de forma que o que escrevo possa ser entendido por qualquer um… por este motivo é que não uso o twitter, por exemplo, pois numa sociedade assim, 144 caracteres me parece, como educador, algo absurdo.

No entanto… suspeito… que muito em breve, 144 letras serão muito… e nos comunicaremos apenas com algumas onomatopéias.

Maranata Jesus!

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Faz tempo eu tenho vontade de re-passar essa "carta de desabafo" do Daniel, publicada originalmente no Púlpito Cristão. Um dos comentários que ela recebeu falava sobre Jesus ter escolhido discípulos iletrados e ignorantes. É mais ou menos fato: metade do Novo Testamento nos chegou através de gente iletrada e ignorante cujo poder das palavras foi conferido não por estudos, mas pelo próprio Espírito Santo. A outra metade nos chegou pela pena de um ex-oficial romano, bem educado e conhecedor de muitas línguas e terras. Ao que me parece, a graça de Deus fez uso tanto deste como daquele.

Então, devemos aceitar pregações pobres de conteúdo? Não mesmo. Entre os "iletrados" que Jesus escolheu, não havia conhecedores de grandes doutrinas, mas havia gente que literalmente escrevia o evangelho com as próprias vidas. Com Paulo, apesar da sua erudição, não foi diferente.

Algo que eu sempre pensei é que a complexidade da vida de um presidente não é diferente da complexidade da vida de um sujeito que passa a vida num casebre à beira do rio. Basta dizer que Jesus sacrificou-se por um e por outro da mesma forma. Enquanto o presidente responde por parte das vidas das pessoas que governa, o home do casebre responde pela família que sustenta. Ambos são importantes! Talvez por isso Jesus não pensasse em deixar o erudito ou o simplório sem as suas palavras. Ele falou tanto ao povo quanto ao governo, ele escolheu "semeadores" daqui e dali, tomando como critério que ambos usassem suas vidas como exemplo. A quem sabia falar aramaico, hebraico, latim e grego, ele fez que usasse essas ferramentas. A quem não sabia, ele presenteou com o dom de falar e ser ouvido por todos, independente do idioma. E todos deram as vidas por Ele, também.

Duas coisas são bem fáceis de fazer: um ignorante fingir-se de conhecedor da Palavra e induzir muitos ao erro (porque de fato aquilo que ele fala não é a sua vida); e um homem culto enganar a muitos mais ignorantes que ele (porque também,. o que fala não é a sua vida). Se Jesus anunciou ser a verdade, como alguém pode mentir e estar em união com Ele? Parece-me que o teor de uma pregação (e vamos generalizar um pouco: prega-se no púlpito e também fora dele, Estevão que o sabia) não precisa se resumir a grandes doutrinas. Claro que ela pode ser feita assim por alguém que seja tão culto, e para pessoas que a possam compreender. E claro que também pode ser muito simplória, mas ganhando força pelo a vida do pregador representa entre aqueles que escutam. Nós damos conteúdo emocional a tudo que ouvimos, e guardamos as palavras de acordo com o conteúdo emocional delas!

Temos muitos analfabetos funcionais no Brasil. Muitos nem lembram deles... mas Deus não costuma se esquecer de ninguém.

Alguns vão dizer: "a Bíblia é um livro". Ignorantes e simplórios estão, por definição, longe dos livros. É verdade, também, mas meia verdade. Há enorme valor em se ler e interpretar a Bíblia, mas é preciso vivê-la. A dificuldade nisso talvez seja até maior ao culto do que ao iletrado... E, havendo igreja (repare a falta proposital do plural, pois Jesus também o esqueceu), o que fazemos nela além de retirar a Bíblia de dentro do livro? Para os iletrados, é esse o Caminho, e certamente se basearão na vidas de quem fala, pois as vidas das pessoas é que são os seus livros. Jesus ensinou os cultos no templo, mas ensinou também os iletrados nas ruas.

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